Estudo UFMG: desmatamento gera perdas agrícolas e aumenta custos de seguros na Amazônia

Pesquisa relaciona pela primeira vez o impacto do desmatamento nos custos das indenizações de seguros agrícolas

Eventos extremos, resultados de uma combinação entre mudanças climáticas e desmatamento, estão afetando cada vez mais a produtividade dos cultivos de milho, da dupla safra soja-milho e da pecuária na Amazônia. Estudo publicado pela UFMG em parceria com a organização norueguesa Rainforest Foundation Norway revela que, em áreas altamente desmatadas no sul do bioma, o número anual de dias com temperatura acima de 35°C aumentou em cinco vezes nas últimas duas décadas. Já os dias consecutivos sem chuva, no mesmo período, tiveram um crescimento de 24%. Como resultado, as quebras de safra estão se tornando mais frequentes, acarretando um aumento no número e nos valores das indenizações pagas.

O estudo também aponta que 21% das 217 mil propriedades rurais que receberam crédito entre 2017 e 2022 apresentavam evidências de desmatamento pós-2008. Desse número, 98% dos casos são de desmatamento potencialmente ilegal por falta de autorização de supressão de vegetação adequada ou falta de vegetação nativa para compor a Reserva Legal na propriedade. Além disso, 8% das propriedades financiadas tinham embargos federais ou estaduais ativos, mas continuaram tendo acesso ao crédito público.

O pesquisador da UFMG e do Centro de Inteligência Territorial Felipe Nunes ressalta que o recente enrijecimento das regras para crédito rural por parte do Banco Central é uma medida crucial para conter o desmatamento. “A fiscalização frágil por parte dos bancos e dos órgãos ambientais, somada aos prazos de transição até 2027, no entanto, ainda pode permitir a concessão de empréstimos a propriedades embargadas ou com análises de CAR [Cadastro Ambiental Rural] pendentes”, adverte.

Desmatamento responde por mais de 80% das indenizações de seguro

De 2010 a 2023, o Programa de Seguro Rural (PSR) subsidiou 23,5 mil contratos na Amazônia Legal, cobrindo uma área de 6,7 milhões de hectares de agricultura e 133 mil cabeças de gado, com prêmios totalizando US$ 244 milhões, dos quais US$ 83 milhões consistiam em subsídios federais, aponta o relatório.

"Estimamos que entre 2010 e 2023, o aumento nos extremos climáticos devido à sinergia entre mudança do clima e desmatamento foi responsável por 95% dos US$ 115 milhões em indenizações pagas a agricultores e pecuaristas na Amazônia pelo PSR. Em áreas amplamente desmatadas, a parcela do desmatamento sozinha responde por 83%", revela Britaldo Soares Filho, professor da UFMG.

"Os resultados do estudo deixam claro o quão paradoxal é a prática do desmatamento para a agricultura em um ecossistema vulnerável como a Amazônia. Quanto mais floresta você derruba, menos chuva sua plantação receberá. Agricultores que avançam sobre a floresta estão, na verdade, sabotando seu próprio futuro", explica Anders Krogh, especialista florestal da Rainforest Foundation Norway.

Degradação florestal agrava consequências das mudanças climáticas

A pesquisa expande a interligação entre a mudança do clima e a degradação florestal na Amazônia. "Os dados revelam que não apenas a destruição em larga escala está impactando os climas locais e regionais, mas também a deterioração menos visível das florestas causada pela mudança do clima e sua fragmentação por estradas, agricultura, pecuária, extração seletiva de madeira, incêndios florestais e outras atividades humanas", aponta Soares Filho.

De acordo com a pesquisa, de 2000 a 2020, cerca de 20% da floresta amazônica brasileira remanescente sofreu uma consistente degradação. As reduções anuais totais na evapotranspiração, em comparação com a floresta íntegra, são de 22% para áreas degradadas e 41% para áreas desmatadas. A menor evapotranspiração resultou em uma diminuição da precipitação anual de 4% em áreas de floresta degradada e de 15% em áreas desmatadas. 

Os pesquisadores alertam: os números são conservadores, porque o efeito do desmatamento na redução das chuvas aumenta quando analisado em uma escala mais ampla. Ainda assim, é evidente que a degradação florestal vem enfraquecendo a capacidade da floresta de formar suas próprias nuvens de chuva.

O paradoxo da prática agrícola na Amazônia

"O governo brasileiro poderia direcionar subsídios públicos para os agricultores que protegem ou recuperam a floresta”, defende o especialista norueguês. Conservar o que ainda existe e reconstituir as áreas degradadas seriam o melhor caminho para garantir a produtividade agropecuária no bioma e evitar que a floresta atinja um ponto ecologicamente irreversível.

Assessoria de Imprensa UFMG

Fonte

Assessoria de Comunicação do Centro de Sensoriamento Remoto

https://csr.ufmg.br/