Morre Ronald Claver, que foi professor do Coltec e ativista cultural na UFMG
O escritor e poeta premiado estava perto dos 79 anos; corpo será velado e sepultado neste sábado, a partir das 10h, em Belo Horizonte

Morreu hoje (sexta-feira, 29), aos 78 anos, o professor, escritor e poeta Ronald Claver Camargo, que ensinou língua portuguesa e literatura no Colégio Técnico (Coltec) da UFMG. Ele estava hospitalizado e não resistiu às complicações de um câncer descoberto há menos de um ano.
Ronald será velado amanhã (sábado, 30), a partir das 10h, na capela 1 do Bosque da Esperança (Rua Aldemiro Fernandes Torres, 1.500, bairro Jaqueline, BH). O corpo será sepultado às 14h, no mesmo local.
Nascido em Belo Horizonte, em setembro de 1946, Ronald Claver licenciou-se em Letras na UFMG em 1971. Começou a carreira de professor na própria Faculdade de Letras, e mais tarde foi cedido ao Coltec – que chegou a dirigir na década de 1980. Publicou mais de 30 livros de poesia, contos, crônicas e literatura infantil e ganhou prêmios como o Jabuti, o Nestlé de Literatura (cinco vezes), o Cidade Belo Horizonte e o Casa de las Américas, de Cuba. Alguns de seus livros de maior sucesso são Dona da palavra, A última sessão de cinema, Todo dia é dia de poesia, Os cadernos de Aninha e Histórias de um professor de História.
Ronald participou ativamente da Revista Literária da UFMG e esteve presente nas antigas Jornadas Culturais e em muitas edições do Festival de Inverno, entre outras atividades. Aposentado desde 1995, ele ministrou, até muito recentemente, a Oficina de Escrita Literária na Organização dos Aposentados e Pensionistas da Universidade (OAP).

Escrita sem dor
Uma das colegas de trabalho no Coltec, a professora Lucia Gouvêa Pimentel, aposentada e professora voluntária da Escola de Belas Artes, conviveu com Ronald por cerca de três décadas. “Ele sempre foi um professor extremamente criativo, que incentivava os alunos a pensar diferente, sempre de maneira alegre. Criou o curso Escreva sem doer num tempo em que não era comum uma atitude mais leve com relação à escrita”, conta Lucia, que lembra das passagens por várias cidades com as Jornadas Culturais, em que as pessoas eram convidadas a cantar e falar poesia em botecos escolhidos.
Segundo Lucia Pimentel, Ronald estava “sempre pronto pra atender quem precisasse, dentro e fora do ambiente de trabalho”, e para conversar sobre os mais diversos temas, muitas vezes sobre as novas questões sobre literatura. “Ele proporcionava uma convivência feliz”, ela diz.
Atual diretor do Coltec, o professor José Eduardo Borges Moreira, o Zé Du, conheceu Ronald Claver ainda durante seus anos de graduação, quando fotografava os espaços da Universidade para o antigo Centro Audiovisual. “Lembro dele, naquela época, supercarismático e já muito respeitado, como professor e escritor. Promovia e participava de muitas atividades extraclasse na Universidade. São memoráveis suas apresentações em público."

Amigo-irmão
O professor de matemática José Eloísio Domingos ingressou junto com Ronald Claver no Coltec, em meados da década de 1970, época da inauguração do colégio. "A amizade nossa é muito grande, Ronald é meu amigo-irmão", ele diz, ainda usando o tempo presente. "Estávamos sempre programando as coisas, discutindo, fazendo." JED, como é conhecido, afirma que Ronald era muito sentimental e um esportista – foi goleiro de futebol de salão na época de estudante. Atleticano apaixonado, Ronald Claver chegou a ocupar o cargo de secretário municipal de Esportes na gestão de Patrus Ananias, na década de 1990.
"Fazíamos churrascos na casa de um e de outro, íamos juntos aos estádios e chegamos a viajar para a Argentina para assistir a uma partida. Ele era um atleticano apaixonado", conta José Eloísio, que foi um dos criadores, junto com Ronald e outros, do movimento cultural Noites da Poesia e da Cachaça, há 25 anos.
Mais elogios que críticas
Reportagem publicada no Boletim UFMG em outubro de 2012 relata parte de uma sessão da oficina da OAP. Ronald ouviu atentamente textos escritos pelos alunos, disse palavras de incentivo e fez recomendações, como a de investir mais em determinada história. Na entrevista, ele disse que alguns dos princípios daqueles encontros eram pouca teoria e mais elogios que críticas e que percebia que os frequentadores ganhavam mais liberdade e se sentiam muito bem ao experimentar um espaço para mostrar sua produção. “Escrever também é hábito. Além da confraternização, os encontros representam um estímulo para que os participantes pratiquem”, afirmou então, segundo a matéria.
Ronald Claver escreveu, para o site que celebrou os 90 anos da UFMG, um texto sobre a Revista Literária. Segundo ele, ser escolhido para publicar no periódico, “quando estudante, era como ganhar o Oscar, o Pulitzer, o Prêmio Nobel, pisar na lua”. No texto, ele lembra também que corriam os anos de chumbo. “A ditadura fazia alarde e publicávamos poemas-cartazes sem mencionar o autor. Publiquei o poema Diálogo, no quinto número da Revista Literária:
a guerra é antes
o silêncio dúbio
da paz
a bomba é antes
um lindo traço
no azul
o diálogo é antes
um grande conflito
do silêncio
a liberdade é antes
uma grande vontade
de palavra
o agora é antes
uma véspera tardia
do amanhã"
Caminhadas e encontros com os amigos
Como destaca a filha Mariana Camargo Aragão em depoimento escrito recentemente, ele viveu até o fim do ano passado sem comorbidades, mantendo hábitos como as caminhadas na Lagoa da Pampulha, a hidroginástica no Clube Labareda e encontros com os amigos no Bar do João.
“O amor é o lema mais importante de sua vida”, escreveu Mariana. “Mesmo nos momentos mais difíceis, consegue manter o humor e fortalecer todos ao seu redor.” Ainda segundo o texto, Ronald tratou a doença com coragem, “tendo como meta a luta incansável pela vida, cercado de muito amor”.
Ronald deixa a viúva, Miriam, os filhos Pablo, Thiago e Mariana.
Assista a vídeo com depoimento de Ronald Claver ao Centro de Memória da Faculdade de Letras.
